MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS DO ESTADO DO TOCANTINS
   

1. Processo nº:5870/2022
    1.1. Apenso(s)

991/2021, 2452/2021

2. Classe/Assunto: 4.PRESTAÇÃO DE CONTAS
2.PRESTAÇÃO DE CONTAS DO PREFEITO - CONSOLIDADAS - 2021
3. Responsável(eis):LEVI TEIXEIRA DE OLIVEIRA - CPF: 55725961168
4. Origem:PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTA ROSA DO TOCANTINS
5. Distribuição:5ª RELATORIA

6. PARECER Nº 315/2024-PROCD

 

Trata-se da prestação de Contas Anuais do Santa Rosa - TO, balanço geral – exercício de 2021, de responsabilidade do Sr. Levi Teixeira de Oliveira, Gestor.

NATUREZA JURÍDICA DO JULGAMENTO

A Constituição Federal reservou para o Poder Legislativo o julgamento das Contas dos Chefes do Poder Executivo nas três esferas: Federal (artigo 71, inciso I), Estadual (artigo 71 c/c 75 e 25) e Municipal (artigo 31, § 2º). Ao Tribunal de Contas cabe a apreciação das mesmas, através de parecer prévio (artigo 71, inciso II), e o julgamento dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário (artigo 71, inciso II, C.F.).

Quais são as contas a que o tribunal aprecia com parecer prévio (artigo 71, inciso I) e as que julga (artigo 71, inciso II)?  

O critério que inicialmente define as competências é relativo à pessoa a ser julgada - “ratione personae”; o conteúdo das contas também distingue o julgamento de competência do legislativo, daquele de competência do Tribunal de Contas.

É que a rigor, os Chefes do Poder Executivo da União, dos Estados e dos grandes Municípios são meros cumpridores do orçamento, e nessa condição repassam as verbas para os Ministérios ou Secretarias, nos termos aprovados no orçamento, com respeito, naturalmente, às demais normas legais e constitucionais, como exemplo, percentual mínimo exigido para a educação, limite máximo de gastos com pessoal, etc., e as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal tão ao gosto de uma profícua administração, a despeito de sua iniciativa (do projeto de Lei que redundou na L.C. 101/00), originar de imposição do capital estrangeiro.

Respeitados tais normas, o orçamento e plano plurianual são motivados por convicções ideológicas e políticas, que definem canalização de recursos, a maior ou a menor, para cada setor que entende prioritário ou não (saúde, segurança, transporte, etc.), segundo seu programa de governo e plataforma partidária.

Nesse particular, a função do Tribunal de Contas sobre as contas anuais do chefe do Poder Executivo é de apreciá-las emitindo parecer prévio. “É um parecer sobre a legalidade, sobre o atendimento das finalidades traçadas no orçamento, enfim se realmente o Poder executivo cumpriu aquilo que está previsto na sua gestão financeira do exercício anterior[1].      

Aflora, daí, a conclusão de que as contas anuais citadas no artigo 71, inciso I, da C.F., abrange todo exercício financeiro anterior e revela somente os aspectos global e formal; o julgamento pelo Legislativo segue esta ordem de análise macro e genérica, de cunho mais político que técnico, guardadas suas proporcionalidades, já que a própria extensão e complexidade das contas, não dispensa um minucioso parecer técnico opinativo do Tribunal de Contas, que neste caso, se define nessa condição: a de auxiliar e não há nenhum trabalho mais auxiliar do que o de elaborar parecer.

Já as contas dos demais administradores e responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos – excetuados, então, somente os Chefes do Executivo na qualidade de Chefe Político - serão julgados pelos Tribunais de Contas - Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, regra constitucional “ratione personae”, embora registre, também, características peculiares de operacionalidade, manejo direto da arrecadação de receitas e ordenamento de despesas. Evidencia-se nestes atos, os pormenores das receitas e despesas públicas, como exemplo, controle e fiscalização do patrimônio – finanças, bens de consumo, permanentes e imóveis quanto aos aspectos formal e fático, da investidura - contratação, vencimento e vantagens dos servidores, da licitação e contratação - obras, bens e serviços, etc. As contas são estanques e por setores, ao contrário das contas dos Chefes do Poder Executivo. O julgamento é exclusivamente técnico e permite um controle mais abrangente da moralidade, legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, contra a indesejável corrupção que permeia e é causa da grande desigualdade social, combatida pelos princípios da República.

Portanto frise-se: a competência para o julgamento das contas por regra se distingue em razão das pessoas, mas diferem também no conteúdo dos atos julgados; a regra constitucional quanto às contas dos Chefes dos Poderes Executivos Estaduais e Municipais, é que ao Tribunal de Contas cabe apreciá-las,  mediante parecer prévio e julgar as demais, oriundas da Presidência da Assembleia Legislativa, Presidência do Tribunal de Justiça, Procuradoria Geral do Ministério Público, Secretarias, etc., podendo ocorrer a possibilidade de julgar as contas do próprio Chefe do Poder Executivo quando se tratar de atos de ordenamento de despesas.

Esta é a determinação do artigo 104 da Lei Estadual 1.284/2001 (Lei Orgânica do TCE/TO):

 

“Artigo 104 – A elaboração do parecer prévio não envolve o exame de responsabilidade dos administradores, incluindo o do Prefeito Municipal e do presidente da Câmara de Vereadores e demais responsáveis de unidades gestoras, por dinheiro, bens e valores, cujas contas serão objeto de julgamento pelo Tribunal.”

 

Ressalta-se, porém, que o Superior Tribunal Federal – STF manifestou-se pela ilegalidade do ato de julgamento do Prefeito no âmbito dos Tribunais de Contas, enquanto ordenador de despesas – RE 729744 – Recurso Extraordinário:

 

RE 729744 - RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator: MIN. GILMAR MENDES

Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, fixou tese nos seguintes termos: “O parecer técnico elaborado pelo Tribunal de Contas tem natureza meramente opinativa, competindo exclusivamente à Câmara de Vereadores o julgamento das contasanuais do Chefe do Poder Executivo local, sendo incabível o julgamento ficto das contas por decurso de prazo”, vencidos os Ministros Roberto Barroso, Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Fux. Ausentes, justificadamente, os Ministros Cármen Lúcia e Teori Zavascki. Presidência do Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 17.08.2016.

 

Por último, o STF assentou no RE 848826 que o Legislativo Municipal é quem detém a legitimidade constitucional para julgamento das Contas de Governo e de Gestão dos Prefeitos: 

 

“RE 848826. Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro Ricardo Lewandowski (Presidente), que redigirá o acórdão, fixou tese nos seguintes termos: “Para os fins do art. 1º, inciso I, alínea "g", da Lei Complementar 64, de 18 de maio de 1990, alterado pela Lei Complementar 135, de 4 de junho de 2010, a apreciação das contas de prefeitos, tanto as de governo quanto as de gestão, será exercida pelas Câmaras Municipais, com o auxílio dos Tribunais de Contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de 2/3 dos vereadores”, vencidos os Ministros Luiz Fux e Rosa Weber. Ausentes, justificadamente, os Ministros Cármen Lúcia e Teori Zavascki. Plenário, 17.08.2016.”

 

MÉRITO

A Lei de Responsabilidade Fiscal trouxe quatro princípios básicos da Administração – o planejamento, a transparência, o controle e a sanção, que permitem apurar com maior eficácia as normas constitucionais para o setor público.

Os órgãos instrutivos desta casa apontaram os dados contábeis do exercício, conforme Análise de Prestação de Contas 609/2023 (ev.12):

 

Despesa

Disp. Legal

Limite %

Efetivamente Gasto

Total com Pessoal

Art. 20, III, ‘a’, LRF

60% da RCL (54% Executivo e 6% Legislativo)

52,07% da RCL (49,27% Executivo e   2,80% Legislativo)

Educação

Art. 212, CF

25% no mínimo, manutenção e desenvolvimento do ensino

25,19%

FUNDEB

Art. 60, XII, CF, e Regulamentado pela Lei nº 11.494/2007 e pelo Decreto nº 6.253/2007

60% no mínimo, Desenv. Ensino Fundamental e a valorização do magistério

70,75%

Saúde

Art. 77, §1º da ADCT c/c LC 141/2012, art. 7º

Mínimo de 15%

17,49%

Total c/o Legislativo

Art. 29-A, I, §2º, I a III

7%

7%

 

Contribuição Patronal ao Regime Geral

 

Art. 195, I da CF

Art. 22, I Lei 8.212/91

 

20% Após deduções legais

 

22%

 

 

Contribuição Patronal ao RPPS do Município

 

Art. 40 da CF

Art. 4º, 5º MPS n° 402/2008 e 21/2013

Art. 2º da Lei Federal 9.717/98

 

Não pode ser inferior ao valor de contribuição do servidor (Lei 9.717/98)

 

 

 

Não há RPPS

 

Conforme o Relatório, na análise das gestões orçamentária, financeira e patrimonial, a equipe técnica apontou irregularidades nas contas, consubstanciadas no Despacho nº 949/2023 da 5ª Relatoria, (ev.13), veja-se:

 

1. Verifica-se que os documentos a seguir relacionados foram enviados sem assinatura (Item 2.1, letra “c” do Relatório):

 - Oficio de Encaminhamento das Contas;

- Declaração do Gestor Certificando a Veracidade do Dados;

- Termo de Conferência dos Saldos Bancários/Caixa em 31 de dezembro de 2021;

- Conciliação dos Saldos Bancários;

- Relação dos Precatórios Judiciais;

- Cópia do Ato do Poder Executivo que Contenha a Opção Quanto ao Regime de Precatório;

- Demonstrativo do valor dos Subsídios dos Agentes Políticos;

- Relatório dos cancelamentos ocorridos;

- Relatório do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo;

- Quadro de todas as Incorporações de Bens, Direitos e Valores ao Ativo Imobilizado;

- Nota Explicativa;

- Discriminação dos Responsáveis por Adiantamentos, Bens e Valores;

- Relação da Frota dos Veículos da Entidade;

- Demonstrativo da Dívida Fundada; e

- Demonstrativo de Contribuição Previdenciária ao Regime Geral de Previdência.

 

2. O Município de Santa Rosa do Tocantins não registrou nenhum valor na conta "Créditos Tributários a Receber" em desconformidade ao que determina o MCASP. (Item 7.1.1.1, letra “b” do Relatório);

3. Registro na conta contábil 1.1.3.4...Crédito por Danos ao Patrimônio no valor de R$ 16.735,40, cuja Nota Explicativa não contém informações (item 7.1.1.2, “b” do Relatório);

4. O Município de Santa Rosa do Tocantins não alcançou a meta prevista no índice de Desenvolvimento da Educação Básica IDEB - Anos Iniciais e Finais em 2021, bem como. (Item 10.1, “m e n” do Relatório).

 

Devidamente citado, o responsável apresentou defesa, conforme expediente nº 14215/2023 (ev. 16).

Ao emitir a Análise de Defesa nº 15/2024 (evento 18), a Coordenadoria de Análise de Contas e Acompanhamento da Gestão Fiscal – COACF considerou que as justificativas e documentos apresentados foram suficientes para sanar todas as irregularidades, mesmo que com ressalvas.

Nesse ínterim, entende-se que as divergências contábeis apontadas pelos técnicos podem ressalvadas e convertidas em recomendação, pois além de sanadas pelos responsáveis, não possuem expressividade para macular o contexto geral da gestão financeira exercício 2021.

Na oportunidade cumpre alertar ao gestor que, doravante, registre, classifique e contabilize as receitas de acordo com a Relação das Contas da Receita Orçamentária emitida por este Tribunal, bem como, cumpra o dispostos nos Arts. 83 a 106 da Lei Federal nº 4.320/64 e as Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicado ao Setor Público.

Ademais, cita-se a seguir precedente do TCE pela aprovação em acaso análogo:

 

PARECER PRÉVIO TCE/TO Nº 128/2023-1ª  CÂMARA (Proc. 11574/2020)

8.1. Emitir Parecer Prévio pela APROVAÇÃO das Contas Anuais de responsabilidade do Sr. Manoel Silvino Gomes Neto, Chefe do Poder Executivo do Município de Tocantínia-TO no exercício de 2019 [...]

8.3. Ressalvar as impropriedades apontadas na instrução dos autos e no Voto, quais sejam:

  1. O Município de Tocantínia-TO não registrou saldo na conta "Créditos Tributários a Receber" em desconformidade ao que determina o MCASP. (Item 7.1.1.1 do Relatório e 9.15 “a” do Voto)

[...]

  1. Saldo na conta contábil 1.1.3.4.0.00.00.00.00.0000 – Créditos por danos ao patrimônio no valor de R$ 117.585,40 (item 9.12.4 do voto).

     [...]

8.4. Recomendar ao atual gestor que adote as medidas junto aos departamentos competentes visando que as impropriedades ressalvadas nas presentes contas não voltem a ocorrer, com destaque:

  1. Realize o controle da execução da receita e despesa por fonte de recurso, nos termos do parágrafo único do artigo 8º c/c inciso I do artigo 50 da Lei nº 101/2000 – LRF, bem como, a correta contabilização dos recursos por fonte, em conformidade com Manual de Contabilidade Aplicado ao Setor Público-MCAASP e o Plano de Contas Único aprovado por este Tribunal;
  2. Adotem todas as medidas visando a apuração da origem do débito e a recomposição dos valores registrados na conta 1134- “Créditos por Danos ao Patrimônio”, conforme os termos da IN TCE/TO nº 04/2016 e 14/2003, adotando a classificação contábil dos referidos saldos no Ativo Permanente, conforme dispõe o art. 8º da IN nº 04/2016;
  3. Adotem medidas junto à contabilidade e departamento responsável pelo controle da arrecadação visando o atendimento dos arts. 11, 13 e 58 da Lei de Responsabilidade Fiscal e art. 39 da Lei 4.320/64, e as disposições do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público - MCASP acerca dos procedimentos contábeis para registro e controle da arrecadação e dívida ativa (inscrição do direito a receber, atualização, reclassificação, ajuste para perdas), e concernentes à sua gestão administrativa e judicial;
  4. Que na realização de despesas cumpram o disposto nos artigos 59 e 60 Lei nº 4.320/64 e arts. 15 a 17 e art. 50, II, ambos da Lei Complementar nº 101/2000, e Resolução Plenária nº 265/2018/TCE-TO de modo que seja realizado o controle da despesa por competência, com a devida análise do impacto orçamentário-financeiro, e que a contabilidade demonstre com fidedignidade todas as transações que impactam no patrimônio e na execução do orçamento público. Assim, o reconhecimento de despesas de exercícios anteriores deve ter caráter excepcional, e desde que cumpridos os requisitos do artigo 37 da Lei nº 4.320/64, de modo a evitar o reconhecimento posterior de despesas cujo fato gerador já era passível de mensuração e registro contábil à época dos fatos ocorridos;

 

Insta salientar, por fim, que durante o exercício não foram realizadas auditorias “in loco”, de forma que as informações são unilaterais do Prefeito, fato que prejudica sobremaneira a aferição da veracidade dos fatos contábeis apresentados.

Assim, com o atendimento dos índices constitucionais e legais referentes ao Total de Despesas com Pessoal, Educação, FUNDEB, Saúde, Duodécimo do Legislativo e Cota Patronal, bem assim que as irregularidades remanescentes não inviabilizam as contas em análise, entende-se que as contas merecem aprovação.

 

CONCLUSÃO

Pelo exposto, o Ministério Público de Contas, diante das informações orçamentárias, financeiras, patrimoniais, contábeis e operacionais fornecidas pelos órgãos instrutivos desta casa, manifesta-se a este Egrégio Tribunal de Contas pela emissão de Parecer Prévio recomendando à Câmara Municipal a APROVAÇÃO das presentes Contas Consolidadas, nos termos artigos 1º, inciso I, 10, inciso III e § 1º, 103 e 104, todos da Lei Estadual nº 1.284/2001 (Lei Orgânica do TCE/TO) c/c artigos 28 e 32 do Regimento Interno, com recomendação de saneamento dos apontamentos técnicos contábeis acima mencionados nas contas subsequentes.

É o Parecer.

 

MARCOS ANTONIO DA SILVA MODES

Procurador de Contas

 

 

 

[1] Regis Fernandes de Oliveira, Revista de Direito Público, 96/218

MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS, em Palmas, aos dias 07 do mês de fevereiro de 2024.

Documento assinado eletronicamente por:
MARCOS ANTONIO DA SILVA MODES, PROCURADOR (A) DE CONTAS, em 08/02/2024 às 16:59:26
, conforme art. 18, da Instrução Normativa TCE/TO Nº 01/2012.
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